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Mostrando postagens de outubro, 2020

O Colosso de Rhodes

  Entre julho e agosto daquele ano, qualquer um que circulasse pelos arredores do Castelo, desde o Museu de Belas Artes até o Tribunal da Justiça Eleitoral, teria a desfelicidade de encontrar a velhinha em questão. “Desfelicidade” não porque fosse velha e, certamente, não por desgosto a senhora – que tão mal não fazia a ninguém – mas pelo súbito questionamento ao termo humanidade com o qual se depararia um que fosse, assim,  afeito a questionamentos. O andar vagaroso acusava a debilidade do corpo, que se mantinha arqueado numa rigidez tão plena que nos fazia imaginar os ossos petrificados na forma de parábola tal que o olhar da mulher não poderia subir acima dos ombros de um que alcançasse pelo menos um metro e setenta de altura. Mas era o aspecto ímprobo das roupas da senhora que dava a tonalidade miserável e a tez anti-social da personagem. De fato, abuso seria até mesmo chamar “roupas” àqueles trajes, que se constituíam de dois pedaços de tecido – possivelmente

O Guarani

  O barulho do ar que escapa - como resultado da descompressão que regula o funcionamento do ônibus quando este pára e abre as portas – chama atenção do pedestre que segue distraído. Entram os últimos e o veículo fecha as portas enquanto o ônibus permanece parado devido ao engarrafamento que enfileira dezenas de automóveis naquela Rua do Passeio, já quase em frente a Escola de Música da UFRJ. Uma panorâmica: da calçada, é possível ver toda a extensão lateral do veículo, com suas janelas dispostas de modo a convidar diálogos soturnos entre os passageiros que habitam tais posições e os outros que esperam no ponto. O olhar fixo de um garoto na parte de trás do ônibus chama atenção: ele recai sobre a figura de uma senhora que, com os braços cruzados, mantém firme a bolsa pendurada em um deles. A mulher ignora a presença do menino que se faz sentir cada vez mais a medida que a atenção do espectador delineia a cena. O menor, preto e em cujos trajes (ainda que em relação apenas àqu